Mickey 17 | Filme brinda o encontro magnífico de Bong Joon-ho e Robert Pattison
Após um hiato de cinco anos desde sua obra premiada, Parasita, o cineasta Bong Joon-ho está de volta às telonas com a sua nova produção. Mickey 17 é uma salada de caos que funciona bem como uma crítica velada a situações que não estão tão distantes da nossa realidade.
A trama acompanha o jovem Mickey Barnes que, para fugir da perseguição de agiotas, aceita encarar uma missão inédita fora da terra. Na jornada, depois de realizar missões, acaba sendo um funcionário “descartado”, mas cujas memórias são restauradas em um novo ser após a morte. No entanto, após inúmeras regenerações, Mickey 17, sua atual versão, sobrevive a uma missão perigosa e acaba enfrentando um dilema existencial ao encontrar sua próxima versão, Mickey 18, que está pronta para substituí-lo.
Dessa vez, ele trouxe um longa diferente da sua filmografia. Longe de tudo que já vimos do cineasta, Mickey 17 é uma ficção científica que aposta no extremo em todas suas pontas, seja nas performances, direção geral, artística e até em seu roteiro. Porém, mesmo com mudanças que fogem do seu comum, ainda é possível enxergar a marca brilhante de Joon-ho no projeto, principalmente quando partimos para as críticas que a produção explora.
Partindo da ideia niilista, somos apresentados a um personagem cético que não se importa em ser cobaia de um projeto que o utiliza como “descartável”. A crítica sobre divisão de classes – pauta que o cineasta adora explorar – surge quando percebemos que todo projeto é apenas uma desculpa para que os menos afortunados sejam meras cobaias nas mãos de homens ricos que só enxergam a ganância necessária para alcançarem mais poder. E, bom, apesar de repetitivo, Joon-ho oferece um recado bem dado sobre o assunto.
Ao perceber tamanho absurdo em que Mickey se submeteu – depois de dezessete tentativas -, o personagem começa a refletir sobre o certo e errado, criando uma 18º versão raivosa e com sede de justiça por si mesmo. Essa divisão de personalidades é bem interessante, porque mostra que todas as variantes dele formariam um indivíduo só; formariam sua alma que foi deixada de escanteio por pura ambição desmedida por um casal de ditadores disfarçados em pele de cordeiro.

Créditos: Warner Pictures / Divulgação
Aliás, vale ressaltar que Robert Pattison é o auge dessa produção. O seu desempenho nos mostra que ele é um ator que não tem medo de se desafiar, mesmo em trabalhos complexos. Acho que para qualquer fã de cinema, é revigorante ver um artista mergulhar por completo em uma performance, e isso é possível ver em toda carreira de Pattison. Impressionante como ele sempre se supera.
Voltando a trama, essa história é contada por uma narrativa bem amarrada pelo humor ácido. Sem ter medo de usar o exagero para cenas montadas por situações trágicas, o filme consegue fazer que o espectador ria de nervoso por Mickey. Porém, quanto mais a história anda, o humor é substituído por desconforto e tensão.

Créditos: Warner Pictures / Divulgação
Essa virada de chave é feita, principalmente, pelos personagens de Mark Ruffalo e Toni Collette, o casal que comanda o projeto em que Mickey é feito de cobaia. Apesar da atriz conseguir medir perfeitamente as camadas da sua performance, Ruffalo não consegue acompanhá-la. O ator é incrível até o segundo ato, entretanto, nos momentos finais ele não consegue medir onde a tensão fala mais alto que a caricatura.
O que nos leva ao momento final do filme que, apesar de nos preparar para algo grandioso, traz uma resolução morna para o problema. Senti que o clímax do filme alcançou o topo, mas a descida foi feita em queda livre, ao invés de semelhar com a descida de uma montanha-russa.
Mickey 17 é diferente; ousado. De fato, não é o melhor projeto de Joon-Ho, mas dificilmente vai ser um filme que você vai se arrepender de assistir. Aliás, sejamos francos, em uma era em que o cinema está apegado em trabalhar com nostalgias e remakes, qualquer experiência com uma produção que apresenta tamanha criatividade é válida.